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MORRE ALESSANDRO UCCELLO, O POETA QUE USA OS OLHOS PARA ESCREVER [Elenilson Nascimento]


MORRE ALESSANDRO UCCELLO, O POETA QUE USA OS OLHOS PARA ESCREVER


“Que futuro tem o amor que nos uneamarrados com fios de navalha se o passado, presente, nos pune o tempo todo, por antigas falhas?” 
(A. Uccello)


Por Elenilson Nascimento 


"Deve-se escrever da mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas fazem seu ofício. Elas começam com uma primeira lavada, molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem o pano, molham-no novamente, voltam a torcer. Colocam o anil, ensaboam e torcem uma, duas vezes. Depois enxáguam, dão mais uma molhada, agora jogando a água com a mão. Batem o pano na laje ou na pedra limpa, e dão mais uma torcida e mais outra, torcem até não pingar do pano uma só gota. Somente depois de feito tudo isso é que elas dependuram a roupa lavada na corda ou no varal, para secar. Pois quem se mete a escrever devia fazer a mesma coisa. A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer", escreveu certa feita o Graciliano Ramos sobre a sua obra “Vidas Secas”. E foi exatamente esse trecho da entrevista do pai da Baleia que eu quis começar esse texto em homenagem ao meu amigo escritor de Brasília, Alessandro Uccello.




Uccello tinha 53 anos e sofria de esclerose lateral amiotrófica (ELA), doença degenerativa que afeta as células do sistema nervoso central que controlam o movimento dos músculos – a mesma enfermidade do físico britânico Stephen Hawking. Conheci a sua história através de uma amiga em comum, a atriz e poetisa Eliane Silvestre, e logo de cara fiquei muito surpreso com a sua luta que rendeu uma excelente entrevista – agora perdida na rede graças a incompetência dos funcionários do Google que deletaram o meu blog Literatura Clandestina.

Em vida, Uccello, com um computador com quatro câmeras que registrava o movimento das suas íris e que lhe permitia se comunicar, trabalhar, escrever livros, fazer piadas e muita poesias – inclusive ele também participou do livro “I Antologia de Poetas Brasileiros Contemporâneos”.

“Não tenho uma rotina, mas escrevo e trabalho todos os dias. Meu principal projeto é um livro de memórias, para minhas filhas saberem o que fiz. Vivi muito nesses 47 anos, viajei, namorei com muitas, trabalhei, tive empresas de consultoria, lojas de CDs e de celular”, disse Uccello. Mas nem tudo em nossas finitas vidas são coisas coloridas e reluzentes. Mas a vida é assim, o que podemos fazer? Coisas ruins acontecem. Às vezes meus leitores nos meus blogs excluídos pediam para que eu deixar um determinado assunto mais feliz, pelo menos um pouquinho, mas nem sempre eu conseguiria.


Mas tão atemporal como a Morte, senhora melancólica e fria, um temporal transformou o nosso escritor dos olhos em um corpo inerte, como Hemingway. Quem é o morto? Quem o matou? A doença? A senhora Vida? A dama de lábios vermelhos chamada Morte? 


Somos agora investigadores e descobriremos que na memória de Uccello, morto na semana passada, há caminhos estranhos que levam aos crimes do não tentar, do reclamar demais, do desistir! Alessandro Uccello, colega escritor, educadíssimo, inteligente, ledor, amado e amando, continuou até o fim lutando por seus sonhos. E ficar acamado não diminuiu sua força, suas conquistas, e ele continuou escrevendo, cheio de amor comendo os papeis, comendo seus remédios, comendo os seus verbos e lançando pensamentos e histórias em livros, além de participar de tardes de autógrafos, de entrevistas em blogs clandestinos até que não foi mais possível. Na semana passada Alessandro finalmente descansou, e nada mais justo que deixar registrado, aqui, um pouco de seu “Legado”.

LEGADO (Alessandro Uccello)

Qual é o sentido de nossas finitas vidas
senão tornar outras vidas mais bonitas?

Deixar filhos, deixar versos, deixar quadros
deixar filmes, deixar livros, deixar flores
deixar fotos, deixar músicas, deixar pratos
deixar obras, deixar marcos, deixar cores

E então, deixar a vida
deixando na vida mais vida
deixando a vida de quem fica
mais rica e mais bonita

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